O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) orientou a Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para impedir a transferência do controle da Eldorado Brasil Celulose da J&F para a Paper Excellence, sem que exista autorização do Congresso Nacional para que a empresa de capital indonésio adquira terras estrangeiras no Brasil.
As fazendas que abastecem a Eldorado de eucalipto, matéria-prima para celulose, estão localizadas em Mato Groso do Sul e no interior de São Paulo. Somente a área arrendada, ou de propriedade da Eldorado, soma 14,4 mil hectares nos municípios de Três lagoas, Inocência e Aparecida do Taboado, apurou o Correio do Estado.
“A Eldorado informa que orientará as suas acionistas a adotar as providências cabíveis que, nos termos da Nota Técnica, incluem cancelar a aquisição e, se houver interesse de ambas as partes em nova transação, solicitar ao INCRA e aos demais órgãos competentes prévia autorização para o negócio”, informou a empresa em comunicado ao mercado, enviado para a CVM.
A Eldorado, no mesmo comunicado, ainda comentou o nota técnica do Incra, do dia 21 de dezembro de 2023, que chegou a conclusão de que o ato de venda do controle da empresa pela J&F à CA Investiment Brazil (o braço brasileiro da Paper Excellence) demandaria autorização prévia do Congresso Nacional, por tratar-se de terra em poder de estrangeiros.
“Como tal autorização não foi obtida, o INCRA comunica a Eldorado e suas acionistas que como o Contrato violou as Leis nº 5.709/1971 e 9.629/1993, o Decreto nº 74.965/1974 e a Instrução Normativa nº 88/2017 e é nula de pleno direito, nos termos do art. 15 da Lei nº 5.709/1971, tendo como solução o desfazimento do negócio entabulado em 2017, e determina a comunicação à Junta Comercial do Estado de São Paulo e CVM”, informou a Eldorado.
A venda
A venda do controle acionário da Eldorado para a Paper Excellence foi feita em 2017, pelos irmãos Joesley e Wesley Batista ao bilionário indonésio Jackson Wijaya, fundador e sócio majoritário da Paper.
A Paper compraria 100% da Eldorado em 12 meses, mas adquiriu somente 49,5%. Logo após, foi iniciada uma batalha jurídica entre eles e a vendedora da Eldorado, a controladora J&F, sobre os 50,5% restantes.
O contrato “representa a aquisição de empresa proprietária e arrendatária de imóveis rurais por empresa equiparada a estrangeira” e, portanto, obrigava a compradora “a requerer previamente à celebração do contrato junto às instâncias competentes (a saber, o Congresso Nacional por meio do Incra) as autorizações indeléveis ao caso”, escreve o Incra no documento.
Apesar praticamente todo seu parque industrial e produtor de matérias-primas estar localizado em Mato Grosso do Sul, a Eldorado tem sua matriz em São Paulo, e, por isso, a comunicação à Junta Comercial, além de ser uma companhia aberta registrada junto à CVM.
O Incra diz ainda na nota que existe uma janela para uma solução negociada entre J&F e Paper Excellence e orienta as empresas sobre “a possibilidade de, em comum acordo entre o adquirente e o transmitente, cancelar a aquisição e —após— permanecendo o interesse, solicitar previamente ao Incra e demais órgãos competentes a autorização, que deverá ser requerida pelo adquirente”.
O lado da Paper
Em nota enviada ao Correio do Estado, a Paper afirma que nunca teve intenção de ficar com a posse das terras. Por isso, a nota do Incra não traz qualquer impacto para a transferência do controle da Eldorado.
A empresa ligada ao bilionário da Indonésia ainda afirmou que não era necessário pedir autorização prévia do Congresso porque ela adquiriu um parque industrial. As fazendas que fornecessem os insumos para as fábricas são de terceiros, com os quais a empresa mantém contrato de parceria. As poucas terras pertencentes à própria Eldorado ficam em áreas urbanas.
“A Paper entende que o contrato de compra da Eldorado atende às preocupações do Incra, do MPF, bem como da própria Justiça, uma vez que a operação não compreende compra de terras rurais, mas sim de um investimento em um complexo industrial”, diz a companhia.
“Importante lembrar que regularmente inúmeros contratos são celebrados envolvendo empresas estrangeiras e terras no País, em setores como o agrícola, pecuária, energético, celulose e outros, sem que isso represente violação ao estatuto da terra no Brasil, em operações semelhantes ao contrato de compra das ações da Eldorado”, comentou a Paper.
Com informações: Correio do Estado